Entre os maiores opositores da legalização do aborto estão os espíritas, mas seus argumentos estão saturados de contradições.
O argumento espírita contra a legalização do aborto é que, segundo o Livro dos Espíritos, o espírito a encarnar se liga ao feto logo na concepção. Este argumento contradiz o próprio Espiritismo em dois pontos.
Segundo Allan Kardec, o Espiritismo só pode ser buscado como resposta quando se esgotam todos os argumentos de ordem científica ou social.
No caso do aborto, há considerações a serem feitas muito antes de apelarmos para respostas fantásticas, a começar com as consequências sociais e de saúde pública.
Do ponto de vista da saúde pública, as mulheres que pretendem abortar vão abortar, mesmo que seja proibido. Portanto a proibição apenas criminaliza essas pessoas, sem melhorar em nada a situação. Isso significa que apelar para o argumento espírita desconsiderando a saúde pública não passa de fanatismo religioso, coisa que o Espiritismo se diz contra.
Do ponto de vista social, a legalização do aborto permite sua fiscalização e intervenção psicológica, permitindo que as grávidas possam ser dissuadidas da ideia sem intimidação. Isso significa que o argumento espírita desconsiderando as consequências sociais presta um desserviço que impede a intervenção respeitosa e saudável.
Se ainda assim o espírita for fanático demais, desconsiderando todos os argumentos, precisaremos apelar para o ataque, demonstrando que o próprio Espiritismo se desmente.
É conhecimento biológico moderno que o feto passa literalmente por todas as etapas evolutivas que a própria espécie sofreu.
Então o feto inicia como um feto pisciano, passa a um feto reptiliano, para finalmente se transformar em um feto mamífero, que se desenvolve para um nasciturno.
Para que o espírito possa se ligar ao feto na concepção, é preciso que ele possa ligar-se a corpos de outras espécies, o que é chamado metempsicose.
Bem, segundo o Espiritismo, a metempsicose é impossível, contradizendo a própria afirmação.
Divaldo Franco afirma que o diferencial do Espiritismo enquanto religião é que ele não tem compromisso com o erro: assim que a ciência prova algo que contradiga alguma crença do Espiritismo, o Espiritismo se adapta e se corrige de acordo com a nova informação.
Porém na prática isso só acontece quando é conveniente. Quando os espíritas estão muito apegados a uma crença (principalmente aquelas de origem nas obras básicas), se a ciência a contradiz, eles simplesmente ignoram – como é o caso da ligação entre espírito e feto. Ou não acontece na concepção, ou a metempsicose é possível.